A golden share, ou “ação dourada” em tradução livre, é um tipo especial de ação que concede ao seu detentor, geralmente um governo ou outra entidade pública, poderes extraordinários na administração e governança de uma empresa. Esses poderes geralmente incluem direitos de veto sobre certas decisões corporativas consideradas de importância crítica.
“As golden shares são comumente emitidas durante processos de privatização de empresas estatais, como forma de garantir que os interesses públicos não sejam comprometidos após a transferência da propriedade para investidores privados”, explica Eric Heidrich Schweitzer, Governance Enablement Specialist da Atlas Governance. “Elas funcionam como um mecanismo de controle que limita a autonomia total dos novos proprietários ou acionistas”, pontua o especialista.
Mas como isso interfere na governança de uma empresa?
Como funciona a golden share
Uma golden share dá ao seu detentor direitos especiais que vão além dos direitos dos acionistas ordinários. Esses direitos podem incluir:
- Poder de veto: o direito de vetar decisões estratégicas, como a venda de ativos importantes, fusões ou aquisições, alterações no estatuto da empresa ou mudanças em sua estrutura de capital.
- Controle de investimentos estratégicos: restrição à entrada de capital estrangeiro em setores considerados críticos.
- Indicação de conselheiros: o poder de indicar membros para o Conselho de Administração da empresa.
- Preservação de interesses nacionais: assegurar que a empresa não tome decisões que possam prejudicar os interesses nacionais ou a segurança do país.
A importância da golden share na governança corporativa
Esse tipo de ações desempenha um papel essencial na Governança Corporativa, especialmente em três áreas principais:
Soberania nacional
Muitos países utilizam a golden share para proteger setores estratégicos. Por exemplo, empresas que operam em setores de energia nuclear, telecomunicações ou defesa são consideradas essenciais para a soberania nacional e a segurança pública. A golden share permite que o governo mantenha o controle indireto dessas empresas, mesmo após sua privatização.
Equilíbrio entre controle Público e privado
A golden share é uma ferramenta que garante o equilíbrio entre os objetivos dos investidores privados e as preocupações públicas. Enquanto os acionistas privados buscam maximizar lucros, o governo pode intervir para assegurar que as operações da empresa continuem a beneficiar a sociedade.
Estabilidade e sustentabilidade de longo prazo
Ela também contribui para a estabilidade de longo prazo das empresas. Ao limitar a possibilidade de decisões corporativas que possam colocar em risco o futuro da empresa ou impactar negativamente a economia, esse mecanismo assegura que o foco permaneça no desenvolvimento sustentável.
Exemplos de golden share no mundo
Petrobras (Brasil)
No Brasil, o governo federal detém golden shares na Petrobras, a principal empresa de energia do país. Essas ações conferem ao governo o poder de veto em decisões importantes, como a transferência de controle acionário e alterações no estatuto social, atendendo aos interesses públicos.
Embraer (Brasil)
A Embraer é outro exemplo brasileiro de uma empresa que possui golden share. Após a privatização em 1994, o governo manteve golden shares que lhe permitem vetar decisões que envolvam mudanças na participação estrangeira no capital social, bem como nas atividades relacionadas à tecnologia militar. Deste modo, esse tipo de ações se torna uma questão de soberania nacional, já que opõe interesses da União aos acionistas estrangeiros.
British Telecom (Reino Unido)
Durante a privatização da British Telecom nos anos 1980, o governo britânico manteve uma golden share que lhe dava direitos especiais para proteger a infraestrutura crítica de comunicação do país.
Volkswagen (Alemanha)
Embora o caso da Volkswagen seja ligeiramente diferente, o governo da Baixa Saxônia detém uma participação especial que funciona de maneira semelhante a uma golden share, garantindo influência nas decisões estratégicas da montadora.
Questões polêmicas de golden share
Alguns especialistas ainda apontam que a golden share pode trazer algumas desvantagens do ponto de vista tecnológico e financeiro para essas empresas. Segundo a opinião dessas pessoas, a presença do governo pode desestimular investidores estrangeiros que buscam maior liberdade operacional.
Além disso, as empresas podem enfrentar dificuldades em implementar mudanças rápidas ou inovadoras devido ao poder de veto e, em alguns casos, a presença de golden shares pode gerar conflitos jurídicos, especialmente em mercados que privilegiam o livre mercado.
Um exemplo recente foi o caso da privatização da Eletrobras. Em 2022, o governo manteve uma golden share, com poderes limitados para vetar decisões que visem à remoção ou modificação da limitação ao exercício do direito de voto e de celebração de acordo de acionistas. Desta forma, a Golden Share tem como principal objetivo garantir a preservação do modelo de capital pulverizado da empresa.
Contudo, em 2023, surgiram debates sobre a ampliação desses poderes, com o governo buscando maior controle sobre nomeações estratégicas e fusões, alegando a importância da empresa para a segurança energética do país.
Essa tentativa foi criticada por investidores, que apontaram riscos à governança corporativa e à segurança jurídica, evidenciando o papel delicado da golden share no equilíbrio entre eficiência empresarial e interesses estratégicos nacionais.
Golden shares: uma medida de governança para o futuro
Com exemplos que vão desde a Petrobras e a Embraer no Brasil até a British Telecom no Reino Unido, é evidente que a golden share desempenha um papel crucial na governança corporativa global. No entanto, para que sua implementação seja eficaz, é fundamental que seja utilizada de forma transparente e em alinhamento com os princípios democráticos e de mercado.
Para que as golden shares permaneçam eficazes e seguras como um mecanismo de governança, é fundamental que as decisões de veto ou intervenções devem ser justificadas com base em critérios técnicos e objetivos, evitando influências políticas desnecessárias.
A administração pública também deve prezar pela transparência quanto aos motivos para exercer seus poderes especiais, garantindo que estejam alinhados ao interesse coletivo, ao mesmo tempo que o uso de golden shares deve ser avaliado periodicamente para assegurar que elas ainda atendam às demandas atuais da população e da economia.